por Márcio Araújo 

Na superfície, a falsa calmaria confunde o olhar desatento.

Os séculos escondem o acúmulo e a tensão produzidas pelo atrito interno.

Do silêncio uma súbita explosão.

A fúria não pode mais ser contida.

Rochas derretidas cortam o ar fervente, flechas em busca de algo a ser atingido.

Destruição manifestada, Equilíbrio interrompido.

Com o tempo, a tensão se esvai. Nada é permanente.

O vento sopra sobre os campos.

Os céus derramam suas bençãos.

Do campo, rico em nutrientes, germinam as sementes.

Com o nascer de um novo dia, a exuberância da vida se faz presente.

Muitas vezes somos tomados por pensamentos, sentimentos e emoções que nos conduzem por caminhos tortuosos.

Vagamos incessantemente repetindo os mesmos padrões que, por incontáveis eras, nos levam ao sofrimento.

Tal qual mariposas, somos atraídos pelos prazeres na esperança de preencher o vazio de nossa existência.

Nossos hábitos e falsas percepções são como véus que ocultam a realidade de que somos doutrinados em um sistema construído em cima de um conceito ilusório de felicidade.

Uma vez que sempre desejamos aquilo que não temos, a frustração e a ansiedade passam a ser as nossas companheiras de jornada.

E como bons acumuladores que somos, nos agarrando não só à matéria mas à valores e crenças, à nossas companheiras também nos prendemos, num interminável ciclo de tropeços.

No extenso canteiro de nossa mente, fornecemos os nutrientes às sementes erradas. Vícios, paixões, ira, compulsão e ignorância são alimentados em detrimento das virtudes, amor incondicional, compaixão, serenidade e sabedoria.

Negamos nossa sombra no intuito de que ela desapareça quando deveríamos abraçá-la, entendê-la, trabalhá-la, anulando seu efeito destrutivo. Nos prendemos em tantas camadas cristalizadas de medos, ressentimentos e incertezas que não conseguimos mais ver a beleza nas coisas simples.

O acúmulo da tensão interna gerada pelo sempre presente fantasma da “ausência de algo” vai minando nossas estruturas internas de tal forma que o choque desses valores produz o mesmo efeito que o súbito movimento de placas tectônicas.

Possessos, vomitamos palavras ácidas e amargas que atingem principalmente àqueles que mais estimamos.

Passada a fúria, mais uma vez navegamos sem rumo, afogando nossa culpa num oceano de consumismo sem fim. Não há mais espaço para delegação da cura e da iluminação.

A semente da mudança está dentro de nós.

Devemos fornecer o ambiente propício para que ela germine, interrompendo os padrões equivocados de nossa existência e dissipando as brumas da ignorância que enevoam nossa consciência.

Precisamos ser diligentes em nossa jornada e nos cercar de pessoas, valores e práticas que nos aproximem do Sagrado e nos afastem do Profano.

O tempo é agora e o lugar é aqui.

Amar, perdoar, contemplar, doar e respirar precisam deixar de serem meras palavras para se tornarem atos concretos em nossas vidas que semeiam um mundo melhor.

Consequentemente, como tudo é inter-dependente, todos colheremos esse tão saboroso fruto.